Ofício de ossos

Esmeraldina botou no mundo doze criaturas, oito se criaram, quatro Deus levou ainda anjos. E só não gerou mais porque o marido Cícero, coveiro da cidade, morreu de uma síncope. Deitou para fazer a sesta e não acordou mais. Tinha espinhela caída, o que não o impedia, de domingo a domingo, de acordar com as galinhas, tomar duas talagadas de cachaça-de-cabeça e seguir para o cemitério. Cavava buraco até a hora do almoço. Depois tirava uma soneca antes de voltar para acompanhar os enterros e selar as tumbas. Esmeraldina cuidava da casa, das crias e da roça com os filhos maiores. Cícero não deixou pensão. Só um cachimbo fedido de fumo-de-rolo e uma dívida no botequim do Seu Castroso. No sertão ser coveiro não apetece a todos os viventes. Tem cabra que tem medo de alma. Cícero dizia que medo de alma era para quem tem rabo-preso com defunto. Por causa disso, Cícero passou trinta anos no ofício sem ser incomodado por viva alma; ou morta. Morto o coveiro, ninguém queria a função funesta....