BELADONA
Beladona nasceu com um problema
que carregou como uma cruz por toda a vida. Veio ao mundo proprietária
inquestionável de uma beleza intoxicante; daí o nome.
Foi
a bebê mais fofa da maternidade: sem ruga, amarelão, hematoma ou inchaço. Verdadeira
top model do berçário. No parquinho sua companhia era disputada pelas mamães,
papais, babás, bebês e até pelos cachorros. Voltava para casa toda lambida e as
bochechas amassadas. Passou a infância sendo assediada, bolinada e elogiada
como uma boneca de vitrine. Lutou até a adolescência por uma identidade
própria. Quis ser professora, veterinária, bombeira, policial, atleta e
cientista. Todo mundo achava graça como ela era linda e brincalhona. Foi capa
de revista infantil, modelo e, para ser atriz, bastou estar de corpo presente
no estúdio ganhando muito dinheiro. A família, orgulhosa, cobria a garota de
mimos. Eram tantos compromissos que
Beladona desistiu de seus sonhos.
Com
o tempo se acostumou com o cardume de gente feia circulando em volta de sua beleza.
Beladona já não se incomodava, muito pelo contrário, vazia parte de sua vida,
vivia disso.
Como
tudo que acostuma adormece, ocorreu algo estranho com Beladona. Ela não
conseguia mais ouvir e nem sentir as pessoas a sua volta. Era apenas um
redemoinho de cores desconexas. A loucura chegou a sua casa e encontrou a porta
aberta e dona de peito escancarado. Os cardumes sumiram, a família apiedou-se e
os fãs choraram.
No
espelho apenas o consolo do rosto distorcido.
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