Tomate e o anel


“Óia o picolé Colegial aí ó!”. Assim passa Tomate do forte do Leme ao forte de Copacabana, pelas areias escaldantes, indo e voltando do nascer ao pôr-do-sol. De pele originalmente branca, de tanto curtir ao sol ganhou o apelido. Gosta de catar objetos esquecidos na praia que pendura em um cordão no pescoço. Tem anéis, pulseiras, lacinho de cachorro, forminha e pá de brinquedo e qualquer coisa colorida ou brilhosa que encontrassem seus pés na areia.
Semana passada Tomate tropeçou num anel prateado com uma pedrona de vidro. Achou lindo e pendurou em local de destaque: no meio dos peitos. Não andou nem dez metros para que uma mulher aos gritos apontasse para ele:
- Ali! Ali!
- Calma, picolé Colegial chegando!
- Meu anel! Ele roubou o meu anel!
Chamaram a polícia. Juntou gente, salva-vidas, vendedor de milho, surfista, jogador de altinho, cachorro e o escambal para defender Tomate, que já declarava:
- Roubei nada, achei tudo.
- Seu policial, o anel sumiu do meu dedo!
- E apareceu no dedão do pé deste Tomate aqui que vos fala, autoridade...
- Eu quero o meu anel!
- Qual deles, madame? Pode escolher!
- O de platina com a pedra de diamante.
- Este bonitão aqui? A senhora tem muito bom gosto prá se vestir quando vem prá praia. Benza Deus...
- Policial, prenda este homem e vamos para a delegacia registrar a queixa.
- Por quê? Eu? O Tomate? Preso?
A zona na areia foi completa. Todo mundo falando ao mesmo tempo. A polícia puxando Tomate de um lado para a viatura e o povo puxando Tomate para o lado da areia aos gritos de “Solta o Tomate! Tá machucando o Tomate!”. Guerra de areia, picolé, milho e cacetada giratória para quem mantivesse as fuças no caminho. Quando conseguiram algemar Tomate, a turba voltou-se contra a senhorinha que leva anel de brilhante para lavar no mar. Jogaram tanta areia na coitada que, antes que fosse enterrada, desistiu da queixa, pensando melhor, ela começou a achar que é bem provável que tenha perdido o anel.
Dessa Tomate escapou.

Comentários

Grande Catarina,
Gostosura de ler...
Anônimo disse…
Catá, alem da qualidade literária, seus textos todos têm uma ironia encantadora!
my

Postagens mais visitadas deste blog

Porque o inferno se perdeu

Nascemos vazios

Uma luva vermelha em Porto Alegre